CAPÍTULOS

 
1 a 10 11 a 20 21 a 31 32 a 42


Capitulo 21
1  Respondeu, porém, Jó, dizendo:
2  Ouvi atentamente as minhas razöes; e isto vos sirva de consolaçäo.
3  Sofrei-me, e eu falarei; e havendo eu falado, zombai.
4  Porventura eu me queixo de algum homem? Porém, ainda que assim fosse, por que näo se angustiaria o meu espírito?
5  Olhai para mim, e pasmai; e ponde a mäo sobre a boca.
6  Porque, quando me lembro disto me perturbo, e a minha carne é sobressaltada de horror.
7  Por que razäo vivem os ímpios, envelhecem, e ainda se robustecem em poder?
8  A sua descendência se estabelece com eles perante a sua face; e os seus renovos perante os seus olhos.
9  As suas casas têm paz, sem temor; e a vara de Deus näo está sobre eles.
10  O seu touro gera, e näo falha; pare a sua vaca, e näo aborta.
11  Fazem sair as suas crianças, como a um rebanho, e seus filhos andam saltando.
12  Levantam a voz, ao som do tamboril e da harpa, e alegram-se ao som do órgäo.
13  Na prosperidade gastam os seus dias, e num momento descem à sepultura.
14  E, todavia, dizem a Deus: Retira-te de nós; porque näo desejamos ter conhecimento dos teus caminhos.
15  Quem é o Todo-Poderoso, para que nós o sirvamos? E que nos aproveitará que lhe façamos oraçöes?
16  Vede, porém, que a prosperidade näo está nas mäos deles; esteja longe de mim o conselho dos ímpios!
17  Quantas vezes sucede que se apaga a lámpada dos ímpios, e lhes sobrevém a sua destruiçäo? E Deus na sua ira lhes reparte dores!
18  Porque säo como a palha diante do vento, e como a pragana, que arrebata o redemoinho.
19  Deus guarda a sua violência para seus filhos, e dá-lhe o pago, para que o conheça.
20  Seus olhos veräo a sua ruína, e ele beberá do furor do Todo-Poderoso.
21  Por que, que prazer teria na sua casa, depois de morto, cortando-se-lhe o número dos seus meses?
22  Porventura a Deus se ensinaria ciência, a ele que julga os excelsos?
23  Um morre na força da sua plenitude, estando inteiramente sossegado e tranqüilo.
24  Com seus baldes cheios de leite, e a medula dos seus ossos umedecida.
25  E outro, ao contrário, morre na amargura do seu coraçäo, näo havendo provado do bem.
26  Juntamente jazem no pó, e os vermes os cobrem.
27  Eis que conheço bem os vossos pensamentos; e os maus intentos com que injustamente me fazeis violência.
28  Porque direis: Onde está a casa do príncipe, e onde a tenda em que moravam os ímpios?
29  Porventura näo perguntastes aos que passam pelo caminho, e näo conheceis os seus sinais,
30  Que o mau é preservado para o dia da destruiçäo; e arrebatado no dia do furor?
31  Quem acusará diante dele o seu caminho, e quem lhe dará o pago do que faz?
32  Finalmente é levado à sepultura, e vigiam-lhe o túmulo.
33  Os torröes do vale lhe säo doces, e o seguiräo todos os homens; e adiante dele foram inumeráveis.
34  Como, pois, me consolais com vaidade? Pois nas vossas respostas ainda resta a transgressäo.


Capitulo 22
1  Entäo respondeu Elifaz, o temanita, dizendo:
2  Porventura será o homem de algum proveito a Deus? Antes a si mesmo o prudente será proveitoso.
3  Ou tem o Todo-Poderoso prazer em que tu sejas justo, ou algum lucro em que tu faças perfeitos os teus caminhos?
4  Ou te repreende, pelo temor que tem de ti, ou entra contigo em juízo?
5  Porventura näo é grande a tua malícia, e sem termo as tuas iniqüidades?
6  Porque sem causa penhoraste a teus irmäos, e aos nus despojaste as vestes.
7  Näo deste ao cansado água a beber, e ao faminto retiveste o päo.
8  Mas para o poderoso era a terra, e o homem tido em respeito habitava nela.
9  As viúvas despediste vazias, e os braços dos órfäos foram quebrados.
10  Por isso é que estás cercado de laços, e te perturba um pavor repentino,
11  Ou trevas em que nada vês, e a abundáncia de águas que te cobre.
12  Porventura Deus näo está na altura dos céus? Olha para a altura das estrelas; quäo elevadas estäo.
13  E dizes: que sabe Deus? Porventura julgará ele através da escuridäo?
14  As nuvens säo esconderijo para ele, para que näo veja; e passeia pelo circuito dos céus.
15  Porventura queres guardar a vereda antiga, que pisaram os homens iníquos?
16  Eles foram arrebatados antes do seu tempo; sobre o seu fundamento um dilúvio se derramou.
17  Diziam a Deus: Retira-te de nós. E: Que foi que o Todo-Poderoso nos fez?
18  Contudo ele encheu de bens as suas casas; mas o conselho dos ímpios esteja longe de mim.
19  Os justos o vêem, e se alegram, e o inocente escarnece deles.
20  Porquanto o nosso adversário näo foi destruído, mas o fogo consumiu o que restou deles.
21  Apega-te, pois, a ele, e tem paz, e assim te sobrevirá o bem.
22  Aceita, peço-te, a lei da sua boca, e pöe as suas palavras no teu coraçäo.
23  Se te voltares ao Todo-Poderoso, serás edificado; se afastares a iniqüidade da tua tenda,
24  E deitares o teu tesouro no pó, e o ouro de Ofir nas pedras dos ribeiros,
25  Entäo o Todo-Poderoso será o teu tesouro, e a tua prata acumulada.
26  Porque entäo te deleitarás no Todo-Poderoso, e levantarás o teu rosto para Deus.
27  Orarás a ele, e ele te ouvirá, e pagarás os teus votos.
28  Determinarás tu algum negócio, e ser-te-á firme, e a luz brilhará em teus caminhos.
29  Quando te abaterem, entäo tu dirás: Haja exaltaçäo! E Deus salvará ao humilde.
30  E livrará até ao que näo é inocente; porque será libertado pela pureza de tuas mäos.


Capitulo 23
1  Respondeu, porém, Jó, dizendo:
2  Ainda hoje a minha queixa está em amargura; a minha mäo pesa sobre meu gemido.
3  Ah, se eu soubesse onde o poderia achar! Entäo me chegaria ao seu tribunal.
4  Exporia ante ele a minha causa, e a minha boca encheria de argumentos.
5  Saberia as palavras com que ele me responderia, e entenderia o que me dissesse.
6  Porventura segundo a grandeza de seu poder contenderia comigo? Näo: ele antes me atenderia.
7  Ali o reto pleitearia com ele, e eu me livraria para sempre do meu Juiz.
8  Eis que se me adianto, ali näo está; se torno para trás, näo o percebo.
9  Se opera à esquerda, näo o vejo; se se encobre à direita, näo o diviso.
10  Porém ele sabe o meu caminho; provando-me ele, sairei como o ouro.
11  Nas suas pisadas os meus pés se afirmaram; guardei o seu caminho, e näo me desviei dele.
12  Do preceito de seus lábios nunca me apartei, e as palavras da sua boca guardei mais do que a minha porçäo.
13  Mas, se ele resolveu alguma coisa, quem entäo o desviará? O que a sua alma quiser, isso fará.
14  Porque cumprirá o que está ordenado a meu respeito, e muitas coisas como estas ainda tem consigo.
15  Por isso me perturbo perante ele, e quando isto considero, temo-me dele.
16  Porque Deus macerou o meu coraçäo, e o Todo-Poderoso me perturbou.
17  Porquanto näo fui desarraigado por causa das trevas, e nem encobriu o meu rosto com a escuridäo.


Capitulo 24
1  Visto que do Todo-Poderoso näo se encobriram os tempos, por que, os que o conhecem, näo vêem os seus dias?
2  Até os limites removem; roubam os rebanhos, e os apascentam.
3  Do órfäo levam o jumento; tomam em penhor o boi da viúva.
4  Desviam do caminho os necessitados; e os pobres da terra juntos se escondem.
5  Eis que, como jumentos monteses no deserto, saem à sua obra, madrugando para a presa; a campina dá mantimento a eles e aos seus filhos.
6  No campo segam o seu pasto, e vindimam a vinha do ímpio.
7  Ao nu fazem passar a noite sem roupa, näo tendo ele coberta contra o frio.
8  Pelas chuvas das montanhas säo molhados e, näo tendo refúgio, abraçam-se com as rochas.
9  Ao orfäozinho arrancam dos peitos, e tomam o penhor do pobre.
10  Fazem com que os nus väo sem roupa e aos famintos tiram as espigas.
11  Dentro das suas paredes espremem o azeite; pisam os lagares, e ainda têm sede.
12  Desde as cidades gemem os homens, e a alma dos feridos exclama, e contudo Deus lho näo imputa como loucura.
13  Eles estäo entre os que se opöem à luz; näo conhecem os seus caminhos, e näo permanecem nas suas veredas.
14  De madrugada se levanta o homicida, mata o pobre e necessitado, e de noite é como o ladräo.
15  Assim como o olho do adúltero aguarda o crepúsculo, dizendo: Näo me verá olho nenhum; e oculta o rosto,
16  Nas trevas minam as casas, que de dia se marcaram; näo conhecem a luz.
17  Porque a manhä para todos eles é como sombra de morte; pois, sendo conhecidos, sentem os pavores da sombra da morte.
18  É ligeiro sobre a superfície das águas; maldita é a sua parte sobre a terra; näo voita pelo caminho das vinhas.
19  A secura e o calor desfazem as águas da neve; assim desfará a sepultura aos que pecaram.
20  A madre se esquecerá dele, os vermes o comeräo gostosamente; nunca mais haverá lembrança dele; e a iniqüidade se quebrará como uma árvore.
21  Aflige à estéril que näo dá à luz, e à viúva näo faz bem.
22  Até aos poderosos arrasta com a sua força; se ele se levanta, näo há vida segura.
23  Se Deus lhes dá descanso, estribam-se nisso; seus olhos porém estäo nos caminhos deles.
24  Por um pouco se exaltam, e logo desaparecem; säo abatidos, encerrados como todos os demais; e cortados como as cabeças das espigas.
25  Se agora näo é assim, quem me desmentirá e desfará as minhas razöes?


Capitulo 25
1  Entäo respondeu Bildade, o suíta, e disse:
2  Com ele estäo domínio e temor; ele faz paz nas suas alturas.
3  Porventura têm número as suas tropas? E sobre quem näo se levanta a sua luz?
4  Como, pois, seria justo o homem para com Deus, e como seria puro aquele que nasce de mulher?
5  Eis que até a lua näo resplandece, e as estrelas näo säo puras aos seus olhos.
6  E quanto menos o homem, que é um verme, e o filho do homem, que é um vermezinho!


Capitulo 26
1  Jó, porém, respondeu, dizendo:
2  Como ajudaste aquele que näo tinha força, e sustentaste o braço que näo tinha vigor?
3  Como aconselhaste aquele que näo tinha sabedoria, e plenamente fizeste saber a causa, assim como era?
4  A quem proferiste palavras, e de quem é o espírito que saiu de ti?
5  Os mortos tremem debaixo das águas, com os seus moradores.
6  O inferno está nu perante ele, e näo há coberta para a perdiçäo.
7  O norte estende sobre o vazio; e suspende a terra sobre o nada.
8  Prende as águas nas suas nuvens, todavia a nuvem näo se rasga debaixo delas.
9  Encobre a face do seu trono, e sobre ele estende a sua nuvem.
10  Marcou um limite sobre a superfície das águas em redor, até aos confins da luz e das trevas.
11  As colunas do céu tremem, e se espantam da sua ameaça.
12  Com a sua força fende o mar, e com o seu entendimento abate a soberba.
13  Pelo seu Espírito ornou os céus; a sua mäo formou a serpente enroscadiça.
14  Eis que isto säo apenas as orlas dos seus caminhos; e quäo pouco é o que temos ouvido dele! Quem, pois, entenderia o troväo do seu poder?


Capitulo 27
1  E prosseguindo Jó em seu discurso, disse:
2  Vive Deus, que desviou a minha causa, e o Todo-Poderoso, que amargurou a minha alma.
3  Que, enquanto em mim houver alento, e o sopro de Deus nas minhas narinas,
4  Näo falaräo os meus lábios iniqüidade, nem a minha língua pronunciará engano.
5  Longe de mim que eu vos justifique; até que eu expire, nunca apartarei de mim a minha integridade.
6  A minha justiça me apegarei e näo a largarei; näo me reprovará o meu coraçäo em toda a minha vida.
7  Seja como o ímpio o meu inimigo, e como o perverso o que se levantar contra mim.
8  Porque qual será a esperança do hipócrita, havendo sido avaro, quando Deus lhe arrancar a sua alma?
9  Porventura Deus ouvirá o seu clamor, sobrevindo-lhe a tribulaçäo?
10  Deleitar-se-á no Todo-Poderoso, ou invocará a Deus em todo o tempo?
11  Ensinar-vos-ei acerca da mäo de Deus, e näo vos encobrirei o que está com o Todo-Poderoso.
12  Eis que todos vós já o vistes; por que, pois, vos desvaneceis na vossa vaidade?
13  Esta, pois, é a porçäo do homem ímpio da parte de Deus, e a herança, que os tiranos receberäo do Todo-Poderoso.
14  Se os seus filhos se multiplicarem, será para a espada, e a sua prole näo se fartará de päo.
15  Os que ficarem dele na morte seräo enterrados, e as suas viúvas näo choraräo.
16  Se amontoar prata como pó, e aparelhar roupas como lodo,
17  Ele as aparelhará, porém o justo as vestirá, e o inocente repartirá a prata.
18  E edificará a sua casa como a traça, e como o guarda que faz a cabana.
19  Rico se deita, e näo será recolhido; abre os seus olhos, e nada terá.
20  Pavores se apoderam dele como águas; de noite o arrebata a tempestade.
21  O vento oriental leva-o, e ele se vai, e varre-o com ímpeto do seu lugar.
22  E Deus lançará isto sobre ele, e näo lhe poupará; irá fugindo da sua mäo.
23  Cada um baterá palmas contra ele e assobiará tirando-o do seu lugar.


Capitulo 28
1  Na verdade, há veios de onde se extrai a prata, e lugar onde se refina o ouro.
2  O ferro tira-se da terra, e da pedra se funde o cobre.
3  Ele pöe fim às trevas, e toda a extremidade ele esquadrinha, a pedra da escuridäo e a da sombra da morte.
4  Abre um poço de mina longe dos homens, em lugares esquecidos do pé; ficando pendentes longe dos homens, oscilam de um lado para outro.
5  Da terra procede o päo, mas por baixo é revolvida como por fogo.
6  As suas pedras säo o lugar da safira, e tem pó de ouro.
7  Essa vereda a ave de rapina a ignora, e näo a viram os olhos da gralha.
8  Nunca a pisaram filhos de animais altivos, nem o feroz leäo passou por ela.
9  Ele estende a sua mäo contra o rochedo, e revolve os montes desde as suas raízes.
10  Dos rochedos faz sair rios, e o seu olho vê tudo o que há de precioso.
11  Os rios tapa, e nem uma gota sai deles, e tira à luz o que estava escondido.
12  Porém onde se achará a sabedoria, e onde está o lugar da inteligência?
13  O homem näo conhece o seu valor, e nem ela se acha na terra dos viventes.
14  O abismo diz: Näo está em mim; e o mar diz: Ela näo está comigo.
15  Näo se dará por ela ouro fino, nem se pesará prata em troca dela.
16  Nem se pode comprar por ouro fino de Ofir, nem pelo precioso ónix, nem pela safira.
17  Com ela näo se pode comparar o ouro nem o cristal; nem se trocará por jóia de ouro fino.
18  Näo se fará mençäo de coral nem de pérolas; porque o valor da sabedoria é melhor que o dos rubis.
19  Näo se lhe igualará o topázio da Etiópia, nem se pode avaliar por ouro puro.
20  Donde, pois, vem a sabedoria, e onde está o lugar da inteligência?
21  Pois está encoberta aos olhos de todo o vivente, e oculta às aves do céu.
22  A perdiçäo e a morte dizem: Ouvimos com os nossos ouvidos a sua fama.
23  Deus entende o seu caminho, e ele sabe o seu lugar.
24  Porque ele vê as extremidades da terra; e vê tudo o que há debaixo dos céus.
25  Quando deu peso ao vento, e tomou a medida das águas;
26  Quando prescreveu leis para a chuva e caminho para o relámpago dos trovöes;
27  Entäo a viu e relatou; estabeleceu-a, e também a esquadrinhou.
28  E disse ao homem: Eis que o temor do Senhor é a sabedoria, e apartar-se do mal é a inteligência.


Capitulo 29
1  E prosseguiu Jó no seu discurso, dizendo:
2  Ah! quem me dera ser como eu fui nos meses passados, como nos dias em que Deus me guardava!
3  Quando fazia resplandecer a sua lámpada sobre a minha cabeça e quando eu pela sua luz caminhava pelas trevas.
4  Como fui nos dias da minha mocidade, quando o segredo de Deus estava sobre a minha tenda;
5  Quando o Todo-Poderoso ainda estava comigo, e os meus filhos em redor de mim.
6  Quando lavava os meus passos na manteiga, e da rocha me corriam ribeiros de azeite;
7  Quando eu saía para a porta da cidade, e na rua fazia preparar a minha cadeira,
8  Os moços me viam, e se escondiam, e até os idosos se levantavam e se punham em pé;
9  Os príncipes continham as suas palavras, e punham a mäo sobre a sua boca;
10  A voz dos nobres se calava, e a sua língua apegava-se ao seu paladar.
11  Ouvindo-me algum ouvido, me tinha por bem-aventurado; vendo-me algum olho, dava testemunho de mim;
12  Porque eu livrava o miserável, que clamava, como também o órfäo que näo tinha quem o socorresse.
13  A bênçäo do que ia perecendo vinha sobre mim, e eu fazia que rejubilasse o coraçäo da viúva.
14  Vestia-me da justiça, e ela me servia de vestimenta; como manto e diadema era a minha justiça.
15  Eu me fazia de olhos para o cego, e de pés para o coxo.
16  Dos necessitados era pai, e as causas de que eu näo tinha conhecimento inquiria com diligência.
17  E quebrava os queixos do perverso, e dos seus dentes tirava a presa.
18  E dizia: No meu ninho expirarei, e multiplicarei os meus dias como a areia.
19  A minha raiz se estendia junto às águas, e o orvalho permanecia sobre os meus ramos;
20  A minha honra se renovava em mim, e o meu arco se reforçava na minha mäo.
21  Ouviam-me e esperavam, e em silêncio atendiam ao meu conselho.
22  Havendo eu falado, näo replicavam, e minhas razöes distilavam sobre eles;
23  Porque me esperavam, como à chuva; e abriam a sua boca, como à chuva tardia.
24  Se eu ria para eles, näo o criam, e a luz do meu rosto näo faziam abater;
25  Eu escolhia o seu caminho, assentava-me como chefe, e habitava como rei entre as suas tropas; como aquele que consola os que pranteiam.


Capitulo 30
1  Agora, porém, se riem de mim os de menos idade do que eu, cujos pais eu teria desdenhado de pór com os cäes do meu rebanho.
2  De que também me serviria a força das mäos daqueles, cujo vigor se tinha esgotado?
3  De míngua e fome se debilitaram; e recolhiam-se para os lugares secos, tenebrosos, assolados e desertos.
4  Apanhavam malvas junto aos arbustos, e o seu mantimento eram as raízes dos zimbros.
5  Do meio dos homens eram expulsos, e gritavam contra eles, como contra o ladräo;
6  Para habitarem nos barrancos dos vales, e nas cavernas da terra e das rochas.
7  Bramavam entre os arbustos, e ajuntavam-se debaixo das urtigas.
8  Eram filhos de doidos, e filhos de gente sem nome, e da terra foram expulsos.
9  Agora, porém, sou a sua cançäo, e lhes sirvo de provérbio.
10  Abominam-me, e fogem para longe de mim, e no meu rosto näo se privam de cuspir.
11  Porque Deus desatou a sua corda, e me oprimiu, por isso sacudiram de si o freio perante o meu rosto.
12  Å direita se levantam os moços; empurram os meus pés, e preparam contra mim os seus caminhos de destruiçäo.
13  Desbaratam-me o caminho; promovem a minha miséria; contra eles näo há ajudador.
14  Vêm contra mim como por uma grande brecha, e revolvem-se entre a assolaçäo.
15  Sobrevieram-me pavores; como vento perseguem a minha honra, e como nuvem passou a minha felicidade.
16  E agora derrama-se em mim a minha alma; os dias da afliçäo se apoderaram de mim.
17  De noite se me traspassam os meus ossos, e os meus nervos näo descansam.
18  Pela grandeza do meu mal está desfigurada a minha veste, que, como a gola da minha túnica, me cinge.
19  Lançou-me na lama, e fiquei semelhante ao pó e à cinza.
20  Clamo a ti, porém, tu näo me respondes; estou em pé, porém, para mim näo atentas.
21  Tornaste-te cruel contra mim; com a força da tua mäo resistes violentamente.
22  Levantas-me sobre o vento, fazes-me cavalgar sobre ele, e derretes-me o ser.
23  Porque eu sei que me levarás à morte e à casa do ajuntamento determinada a todos os viventes.
24  Porém näo estenderá a mäo para o túmulo, ainda que eles clamem na sua destruiçäo.
25  Porventura näo chorei sobre aquele que estava aflito, ou näo se angustiou a minha alma pelo necessitado?
26  Todavia aguardando eu o bem, entäo me veio o mal, esperando eu a luz, veio a escuridäo.
27  As minhas entranhas fervem e näo estäo quietas; os dias da afliçäo me surpreendem.
28  Denegrido ando, porém näo do sol; levantando-me na congregaçäo, clamo por socorro.
29  Irmäo me fiz dos chacais, e companheiro dos avestruzes.
30  Enegreceu-se a minha pele sobre mim, e os meus ossos estäo queimados do calor.
31  A minha harpa se tornou em luto, e o meu órgäo em voz dos que choram.


Capitulo 31
1  Fiz aliança com os meus olhos; como, pois, os fixaria numa virgem?
2  Que porçäo teria eu do Deus lá de cima, ou que herança do Todo-Poderoso desde as alturas?
3  Porventura näo é a perdiçäo para o perverso, o desastre para os que praticam iniqüidade?
4  Ou näo vê ele os meus caminhos, e näo conta todos os meus passos?
5  Se andei com falsidade, e se o meu pé se apressou para o engano
6  (Pese-me em balanças fiéis, e saberá Deus a minha sinceridade),
7  Se os meus passos se desviaram do caminho, e se o meu coraçäo segue os meus olhos, e se às minhas mäos se apegou qualquer coisa,
8  Entäo semeie eu e outro coma, e seja a minha descendência arrancada até à raiz.
9  Se o meu coraçäo se deixou seduzir por uma mulher, ou se eu armei traiçöes à porta do meu próximo,
10  Entäo moa minha mulher para outro, e outros se encurvem sobre ela,
11  Porque é uma infámia, e é delito pertencente aos juízes.
12  Porque é fogo que consome até à perdiçäo, e desarraigaria toda a minha renda.
13  Se desprezei o direito do meu servo ou da minha serva, quando eles contendiam comigo;
14  Entäo que faria eu quando Deus se levantasse? E, inquirindo a causa, que lhe responderia?
15  Aquele que me formou no ventre näo o fez também a ele? Ou näo nos formou do mesmo modo na madre?
16  Se retive o que os pobres desejavam, ou fiz desfalecer os olhos da viúva,
17  Ou se, sozinho comi o meu bocado, e o órfäo näo comeu dele
18  (Porque desde a minha mocidade cresceu comigo como com seu pai, e fui o guia da viúva desde o ventre de minha mäe),
19  Se alguém vi perecer por falta de roupa, e ao necessitado por näo ter coberta,
20  Se os seus lombos näo me abençoaram, se ele näo se aquentava com as peles dos meus cordeiros,
21  Se eu levantei a minha mäo contra o órfäo, porquanto na porta via a minha ajuda,
22  Entäo caia do ombro a minha espádua, e separe-se o meu braço do osso.
23  Porque o castigo de Deus era para mim um assombro, e eu näo podia suportar a sua grandeza.
24  Se no ouro pus a minha esperança, ou disse ao ouro fino: Tu és a minha confiança;
25  Se me alegrei de que era muita a minha riqueza, e de que a minha mäo tinha alcançado muito;
26  Se olhei para o sol, quando resplandecia, ou para a lua, caminhando gloriosa,
27  E o meu coraçäo se deixou enganar em oculto, e a minha boca beijou a minha mäo,
28  Também isto seria delito à puniçäo de juízes; pois assim negaria a Deus que está lá em cima.
29  Se me alegrei da desgraça do que me tem ódio, e se exultei quando o mal o atingiu
30  (Também näo deixei pecar a minha boca, desejando a sua morte com maldiçäo);
31  Se a gente da minha tenda näo disse: Ah! quem nos dará da sua carne? Nunca nos fartaríamos dela.
32  O estrangeiro näo passava a noite na rua; as minhas portas abria ao viandante.
33  Se, como Adäo, encobri as minhas transgressöes, ocultando o meu delito no meu seio;
34  Porque eu temia a grande multidäo, e o desprezo das famílias me apavorava, e eu me calei, e näo saí da porta;
35  Ah! quem me dera um que me ouvisse! Eis que o meu desejo é que o Todo-Poderoso me responda, e que o meu adversário escreva um livro.
36  Por certo que o levaria sobre o meu ombro, sobre mim o ataria por coroa.
37  O número dos meus passos lhe mostraria; como príncipe me chegaria a ele.
38  Se a minha terra clamar contra mim, e se os seus sulcos juntamente chorarem,
39  Se comi os seus frutos sem dinheiro, e sufoquei a alma dos seus donos,
40  Por trigo me produza cardos, e por cevada joio. Acabaram-se as palavras de Jó.